segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Esquecí de assinar a postagem!!

Luciana Deus

Livros, uma paiXão


Adorei o vídeo do you tube!! Não deixem de dar uma olhada! 
E aproveitando o tema que ele traz, gostaria de continuar com o "X das     questões" das últimas  postagens, para algo tão presente em minha vida: a paiXão pelos livros.
Jorge Luis Borges escreveu algo interesante sobre O LIVRO:
"Dos diversos instrumentos do homem, o mais assombroso é,indubitavelmente,
o livro. Os outros são extensões do seu corpo. O microscópio e o telescópio são extensões da vista; o telefone é o prolongamento da voz; seguem-se o arado e a espada, extensões do seu braço. Mas o   livro é outra coisa: o livro é uma extensão da memória e da imaginação.
Em «César e Cleópatra» de Shaw, quando se fala da biblioteca de Alexandria, diz-se que ela é a memória da humanidade. O livro é isso e também algo mais: a imaginação. Pois o que é o nosso passado senão uma série de sonhos? Que diferença pode haver entre recordar sonhos e recordar o passado? Tal é a função que o livro realiza.

(...) Se lemos um livro antigo, é como se lêssemos todo o tempo que transcorreu até nós desde o dia em que ele foi escrito. Por isso convém manter o culto do livro. O livro pode estar cheio de coisas erradas, podemos não estar de acordo com as opiniões do autor, mas mesmo assim conserva alguma coisa de sagrado, algo de divino, não para ser objecto de respeito supersticioso, mas para que o abordemos com o desejo de encontrar felicidade, de encontrar sabedoria."
 

Maria Tomaselli

Caros estudantes,
gostaria muito que vcs vissem o blog que a Maria Tomaselli (artista austro-brasileira sobre quem fiz um livro homônimo lançado em 2009) está fazendo: http://seuismael.blogspot.com/
é um trabalho com mendigos em Porto Alegre. Opinem, se quiserem, ela está sempre aberta à percepção de gente inteligente.
Ela tem colocado vários processos dela no blog http://mariatomaselli.blogspot.com
e no site dá pra ter uma idéia do que ela faz: http://to.plugin.com.br

Aproveitem, já que estão por aí e vejam isso também http://www.youtube.com/watch?v=_an5z2lxXH4&feature=related


abraços a todos, 
Marcia 

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Reflexões sobre a 1ª aula (17 de fevereiro de 2011)

 Por Vinicius Tavano
No dia 17 de fevereiro de 2011 aconteceu a aula inaugural da disciplina de Teoria e Critica das Artes, ministrada pela professora Drª Marcia T. para a turma ingressante do programa de Pós graduação em Educação, Arte e História da Cultura – Mestrado. Na aula em questão a docente apresentou um conceito para mim até então desconhecido, conceito hegeliano de que a “arte morreu”. No meu entendimento, não ocorreu que a partir de um determinado ponto da história aquilo que era arte deixou de ser considerada como tal, mas que , segundo Luis Fernando Encina*
...o que ele concebe é apenas o movimento da perda de sentido da intuição estética imediata, entendida como lugar de plenitude ou de satisfação do espírito, substituída pelas formas puras do entendimento.[1]
O debate surgido após as considerações iniciais de nossa professora estava muito instigante e dele surgiram outras discussões paralelas, e foi numa dessas colocações que originou um assunto que foi produto de muitas reflexões de minha parte e gostaria de aproveitar esse espaço para compartilhar com os leitores desse blog as minhas considerações sobre o tema.
O assunto em questão é o debate surgido quando se levantou o tema da pixação como forma de arte. Pois bem, o assunto já causa polêmica com a própria grafia da palavra, onde encontramos registros gráficos com X e com CH.
Vamos exemplificar dois casos: Alexandre Barbosa Pereira[2] em seu artigo As marcas da cidade: a dinâmica da pixação em São Paulo, publicado na Revista Lua Nova, utiliza a grafia com X; e explica
Adoto aqui a grafia da palavra pixação, com “x”, e não com “ch”, conforme rege a ortografia oficial, para respeitar o modo como os pixadores escrevem o termo que designa sua prática. Esse modo particular de grafar é apontado por alguns pixadores como uma maneira de diferenciar-se do sentido comum atribuído à norma culta da língua: pichação. “Pixar” seria diferente de “pichar”, pois este último termo designaria qualquer intervenção escrita na paisagem urbana, enquanto o primeiro remeteria às práticas desses jovens que deixam inscrições grafadas de forma estilizada no espaço urbano.[3]

Já Davi da costa Souza, em sua dissertação de mestrado - Pichação carioca: etnografia e uma proposta de entendimento - pelo Programa de Pós Graduação em Sociologia e Antropologia Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, utiliza o termo como na ortografia oficial, ou seja com CH.
Em respeito a esses artistas, também vou pedir licença a norma oficial e tratar o tema da forma que os interessados a tratam, ou seja, utilizando a grafia com X.
Acredito que a pixação como manifestação artística é indiscutível, embora não tenhamos condição de definir o que é arte, porém pensemos que os pichadores encontraram uma maneira bastante criativa de expressão. O que venho a discutir é qual é o preço dessa manifestação e quais são suas consequências para os artistas e para os que estão envolvidos nesta manifestação de forma direta e indireta.
Um dos pontos abordados durante a aula é que a pixação é uma forma de dar voz a uma classe oprimida, porém, se fizermos uma pesquisa sobre o perfil desses artistas, veremos que boa parte deles não pertencem a uma classe social oprimida por um sistema que os cala, tendo na pixação a única forma de manifestação contra um estado[4] opressor, comprometido com o bem estar da classe burguesa. Até porque, um estado que tributa seus contribuintes em 40% pode ser considerado opressor também pela burguesia.
No livro Pichação: O Simbolismo Estético de Movimento Social, Paulo Ernesto Dias Rozena[5]
Aponta o perfil dos pichadores da cidade do Rio de Janeiro

“Temos no Rio de Janeiro cerca de 10.000 pichadores de rua, pais, filhos, esposas e irmãos. Em alguns casos, famílias inteiras. Pessoas que variam de idade de 10 a 51 anos e vão desde profissionais liberais a funcionários públicos os pichadores são pessoas na maioria dos casos politizadas e não meninos inconsequentes.”[6]
O repórter Adriano Duarte da revista Pioneiro[7], de Caxias do Sul publicou uma ampla reportagem sobre o tema, onde aponta que o perfil dos pixadores são jovens de todas as classes sociais, eles se juntam em grupo que variam de 5 a 30 pessoas e alguns estão envolvidos em atividades criminosas, como o trafico de drogas e o roubo a automóveis. Normalmente os lideres desses grupos são estudantes do ensino médio ou universitários. Em geral são trabalhadores, já que a pratica da atividade não sai barata, uma vez que para registrar sua manifestação, o pixador necessita de tinta látex ou tinta spray, como querem deixar seus registros em evidencia, precisam utilizar muita tinta, e isso encarece a atividade.
Refletindo sobre as informações acima expressas, questiono se esses artistas fazem mesmo parte de uma classe socialmente oprimida e que a pixação em espaços privados e públicos seja a única maneira de expressão que eles apresentam.
Acredito que o maior problema na manifestação dos pixadores esta no fato de eles invadirem propriedades privadas sem o consentimento de seus proprietários para registrar suas manifestações, e isso nos remete a outro ponto levantado durante a aula: “que direito o proprietário tem de ter um muro branquinho e eu, pixador, não posso fazer intervenções, não posso me manifestar, tenho que ficar calado”. Primeiramente não haveria problema algum em o pixador se manifestar em um muro branquinho, desde que o proprietário daquele muro branquinho estivesse autorizando a pratica; segundo, de acordo com estudos feitos e apontados neste artigo, vimos que os pixadores, ou pelo menos boa parte deles, não pertencem a essa classe socialmente oprimida e ansiosa por manifestar sua opinião e suas angustias, pertencem sim a mesma classe daquele que tem um muro branquinho. Além do mais, o pixador, quando sai as ruas para registrar suas manifestações, não faz uma analise sociológica do dono do muro branquinho, para saber se ele está do lado do opressor ou do oprimido.
Durante a aula mais um ponto que serviu de reflexão e me estimulou a escrever este artigo, relaciona-se ao direito democrático de manifestação dos pixadores, ou seja, a democracia seria usada como embasamento teórico pra a prática da pixação. Lembramos aqui que Democracia é a ditadura da maioria e se fizermos um senso, perguntando se somos a favor ou contra a pixação, é bem provável que a maioria de nós responderia que somos contra, portanto, nem esse direito democrático esses artistas teriam, já que suas praticas não são endossadas pela maioria da população, agora, se falarmos que os pichadores tem o direito libertário de pixar muros e fachadas, ai poderemos fazer outra reflexão sobre o assunto.
O libertarianismo é uma filosofia política e social que prega a liberdade individual até suas últimas consequências, essa teoria foi elaborada por diversos pensadores durante a segunda metade do século XIX e o século XX como o francês Pierre Joseph Proudhon, pai do libertarianismo mutualista, Ludwig Von Mises, pai do anarco capitalismo, dentre outros. Não existe uma única linha de pensamento dentro do libertarianismo, inclusive, seus adeptos divergem em muitos pontos (anarco coletivismo, algorismo, mutualismo, minarquismo, anarco capitalismo), mas convergem no que se trata da liberdade individual, diferente do democrata, o libertário se sente no direito de praticar a sua liberdade mesmo que sua prática seja socialmente repudiada, em razão disso, o libertário, em linhas gerais são favoráveis a liberalização das drogas, de qualquer forma de casamento civil e da total liberdade de imprensa, manifestação e expressão, segundo os libertários não existe crime sem vitima.
Partindo do principio libertário, os pixadores teriam a liberdade de pixar onde bem entendessem, afinal de contas, estariam apenas se manifestando e expressando suas opiniões e estéticas artísticas, o problema é que mesmo para os libertários a liberdade individual tem suas limitações. Para os mutualistas a liberdade do individuo não pode se sobrepor a liberdade de outrem, ou seja, sua liberdade termina quando começa a liberdade do outro. Para os anarco capitalistas, sua liberdade é inviolável dentro de sua propriedade, porém, na propriedade alheia, segue-se a regra do outro proprietário, ambos creem na legitima defesa, no principio da não agressão e que não há crime quando não há vitima.
Observando os pichadores pelo prisma libertário, ainda assim eles não teriam o direito de pixar sem a autorização dos proprietários, isso viola o direito absoluto de propriedade, sob a ótica do anarco capitalista e invade a liberdade alheia (daqueles que não gostam da manifestação artística, ou do proprietário do muro branquinho) segundo a ótica dos mutualistas, ambos se sentiriam vitimas das manifestações artísticas dos pichadores, caso não concordassem com elas.
Essas são as minhas colocações sobre um polêmico tema que não se encerra aqui, e sei que com o passar dos tempos, nossas posições tendem a se transformar, assim como tudo neste mundo se transforma, inclusive nossas ideias e opiniões.
Vinicius Tavano

[1]ENCINA, L.F.C DISSOLUÇÃO E INDETERMINAÇÃO NA LITERATURA AMERICANA DO PÓS-GUERRA, IN: Kínesis, Vol. II, n° 04, Dezembro-2010, p. 95.

[2]Doutorando em Antropologia Social pelo PPGAS/USP e pesquisador do NAU/USP

[3]Lua Nova, São Paulo, 79: 143, 2010

[4] Faço aqui o uso da palavra estado em minúsculo, compactuando com alguns meios de imprensa que utilizam esta forma de expressão do termo.
[5].Paulo Ernesto Dias Rozena é bombeiro militar do Exército há 18 anos, graduado como sargento do BM, é também técnico em prótese dentária e cursou História na Faculdade Moacyr Sreder Bastos. Como trabalho final da faculdade de História, Paulo apresentou a monografia: Pichação – O Simbolismo Estético de um Movimento Social. A monografia deu origem ao livro Pichação: O Simbolismo Estético de Movimento Social.
[6].Jornal Folha do Centro – Rio Edição N° 166 - Julho de 2010 pagina 3
[7] 07 de novembro de 2009 nº 10.578, seção Vandalismo, p.16 a 18.

peXquisador

Fiz algumas considerações acerca das pichações e dos pichadores.

A professora Márcia comentou que o que o pichador faz é justamente questionar a estética da fachada.

Vivemos sim, desCARAdamente, em uma estética da fachada e a cidade é o local por excelência em que tal estética se revela.  O branco é o ácido botulínico que não pode revelar as periferias. É a estética da exclusão, dos (poucos) que têm e dos (muitos) que não têm. Portanto, pichador só pode existir em uma sociedade desigual, individualista e ainda não resolvida, em que alguns pertencem a cidade oficial e outros não.  

De todo modo, a exclusão que vemos é sempre a explícita, a da fachada, a dos muros.  Se pudermos qualificar a exclusão, a pior é a implícita, aquela que (quase) ninguém percebe, pois ambos compartilham dos mesmos códigos vigentes, marcando o que é certo e o que é errado, o que é bonito e o que é feio, o que é bom e o que não é e tantas outras dicotomias.

Como afirmou Pierre Bourdieu em seu texto “Efeitos de Lugar” em A Miséria do Mundo, “o espaço social encontra-se inscrito ao mesmo tempo nas estruturas espaciais e nas estruturas mentais que são, por um lado, o produto da incorporação dessas estruturas, o espaço é um dos lugares onde o poder se afirma e se exerce, e, sem dúvida, sob a forma mais sutil, a da violência simbólica como violência desapercebida: os espaços arquitetônicos, cujas injunções mudas dirigem-se diretamente ao corpo, obtendo dele, com a mesma segurança que a etiqueta das sociedades da corte, a reverência, o respeito que nasce do distanciamento ou, melhor, do estar longe, à distância respeitosa, são, sem dúvida, os componentes mais importantes, em razão da sua invisibilidade, da simbólica do poder e dos efeitos completamente reais do poder simbólico”.

Assim, o pichador é sempre o outro, aquele que está fora da cidade oficial, que está nos subúrbios e que, ao mesmo tempo em que questiona a cidade oficial com a sua pichação, reifica esta mesma ordem social com o spray, que por sua vez, conclama a ação do poder público.

Já o poder público, que deveria estar a serviço do que de fato é público, está a serviço, quase sempre, do que é privado, e este quase sempre se plasma naquele, constituindo o que Raymundo Faoro chamou de “os donos do poder”, ou seja, a inserção do privado no público e vice-versa.  Quanto a isto, basta atentarmos para os vestígios do passado no presente quando observamos ações violentas do Estado no controle da ordem pública (como por exemplo, das investiduras policiais contra negros que são quase sempre suspeitos ou quando o governo constrói uma rampa antimendigo, ou ainda quando constrói muros - que serão pichados - em uma praça, evitando pessoas indesejadas).  O pichador questiona a (na) cidade o que o peXquisador questiona na academia.

Um outro aspecto que me parece relevante é o fato de que os pichadores são, em sua maioria, jovens.  Estes, como categoria criada em nossa sociedade capitalista, corresponde a um período que é marcado pelo extrapolar e pela transgressão. Aliás, é permitido até o oposto: “nada fazer”. Em alguns contextos, o adolescente é considerado criança, em outros, adulto.

Tenho a impressão que eles nem gostem tanto da pichação em si. O mais importante é a proibição do ato.  É a prática proibitiva que importa para o pichador, talvez ele nem se preocupe com o resultado. Some-se a isto um culto a virilidade dado pela cultura atual e encontraremos pichações mais ousadas, em prédios mais altos.

É neste jogo dado a priori pela sociedade, do proibido em determinados momentos e do permitido em outros, que o pichador realiza a dialética da sua identidade, que ele sente o pertencimento a cidade = sociedade, que foi e continua sendo marcada pela exclusão.

Em suma, todo pixar é dor...

Marcos Chiesa

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Pensamento PiXação

Caros estudantes, escrevi o texto abaixo para a Revista Cult 135. Vejam se interessa. beijos da profe.

Pensamento PiXação

Para questionar a estética da fachada


A revolta geral da sociedade contemporânea contra a pichação se ampara na hipótese de seu caráter violento. Usarei a expressão pixação, com X, para tentar tocar no X da questão.  A estética da brancura ou do liso dos muros, hegemônica em uma sociedade que preserva o ideal da limpeza estética, dificulta outras leituras do fenômeno da pixação. O excessivo amor pela lisura dos muros, a sacralização que faz da pixação demônio, revela enquanto esconde uma estética da fachada.
Toda estética inclui uma ética, assim a da fachada. Fachada é aquilo que mostra uma habitação por fora; pode tanto dar seqüência ao que há na interioridade, quanto ser dela desconexo. É da fachada que se baste por si mesma à medida que lhe é próprio ser suficiente aos olhos. A estética da fachada que defende o muro branco é a mesma que sustenta a plastificação dos rostos, a ostentação dos luxos no “aparecimento geral” da cultura espetacular, no histérico “dar-se a ver” que produz efeitos catastróficos em uma sociedade inconsciente de seus próprios processos.

Nesta São Paulo do começo de século 21 não é permitido cobrir “fachadas” com propagandas e outdoors. A proibição, ainda que democrática, produz um novo efeito de observação da cidade. Tornou-se visível o que se ocultava por trás do “embelezamento” capcioso sobre um outro cenário. A obrigação do padrão do liso é efeito da democracia que, no entanto, flerta com sua manutenção autoritária. É o desejo governamental da neutralidade e da objetividade no espaço público o que deve servir de cenário à vida na cidade. Governar é no Brasil a habilidade de comandar a fachada que na administração paulistana sai do símbolo para entrar na prática mais imediata do cotidiano. A vontade de fachada é, afinal, uma vontade de poder compartilhada por toda a cultura em todos os seus níveis.
A pixação é o contrário do outdoor, ainda que compartilhe com ele a proibição de aparecer no cenário urbano comprometido pelo governo com uma neutralidade que serve à mesma ocultação de carroceiros e outros excluídos. Ampara-se no olhar burguês cego para mendigos e crianças abandonadas nas ruas. Enquanto o outdoor pode se sustentar no pagamento das taxas que o permitem, a pixação não alcança nenhuma autorização, ela está fora das relações de produção. O que o outdoor escondia era muitas vezes a própria pixação, enquanto a pixação não esconde nada, ela é o que se mostra quando ninguém quer ver sendo meramente compreendida como “ofensa” ao muro branco. Anti-capitalista, a pixação não se insere em nenhuma lógica produtiva, ela é irrupção de algo que não pode ser dito. Sem pagar taxas, o pichador exercerá uma espécie de lógica da denúncia. Mas quem poderá perceber?

Não é possível negar o direito ao muro branco ou liso em uma sociedade democrática, na qual está sempre em jogo a convivência das diferenças. O direito ao muro branco é efeito da democracia. Mas a questão é bem mais séria do que a sustentação de uma aparência ou de um padrão do gosto. A pixação é também um efeito da democracia, mas apenas no momento à ela inerente em que ela nega a si mesma. Ela é efeito do mutismo nascido no cerne da democracia e por ela negado ao fingir a inexistência de combates intestinos e velados. A pixação é, neste sentido, a assinatura compulsiva de um direito à cidade. Um abaixo-assinado, às vezes surdo, às vezes cego, pleno de erros, analfabeto, precário em sua retórica, mas que, em sua forma e conteúdo, sinaliza um retrato em negativo da verdade quanto ao espaço - e nosso modo de percebê-lo - nas sociedades urbanas. Espaço atravessado, estraçalhado, pela exclusão social.

A pixação é uma gramática que requer a compreensão da brancura dos muros. O gesto de escrever só pode ser compreendido tendo em vista que todo signo, letra, palavra, investe-se contra ou a favor de um branco pressuposto no papel. O grau zero da literatura é esta luta com o branco. A escrita é combate contra o branco, negação do alvor fanático, como o pensamento é sempre oposição e negação do que se dispõe como evidente, convencional, pressuposto. Por outro lado, a escrita é abertura e dissecação do branco, lapidação do branco pelo esforço da pedra, mas nunca sua confirmação, nunca é a ação da borracha, do apagamento, da camada de tinta que alisará o passado, o que desagrada ver. Sua lógica é a do inconformismo infinito. Imagine-se uma sociedade em que o papel não fosse feito para a escrita, em que as superfícies brancas de celulose não sustentassem idéias, comunicação, expressão, afetos, anseios, angústias. Imagine-se uma sociedade em branco e começar-se-á a entender porque a pixação nas grandes cidades é bem mais do que um ato vândalo que, para além de ser uma forma de violência, define a cidade como um grande livro escrito em linguagem cifrada. O pichador é o mais ousado escritor de todos os tempos. Diante do pichador todo escritor é ingênuo. Diante da pixação a literatura é lixo.

A Cidade como Mídia

Uma leitura da pixação que veja nela a mera ofensa ao branco perderá de vista a negação filosófica do branco que é exercida pela pixação. A pixação eleva o muro a campo de experiência, faz dele algo mais do que parede separadora de territórios. Mais que propriedade invadida é a própria questão da propriedade quanto ao que se vê que é posta em xeque.

A pixação é o grito impresso nos muros. Ação afetivo-reflexiva em uma sociedade violenta que não aceita a violência que advém de um estado de violência. Ela é a marca anti-espetacular, o furo no padrão da falsidade estética que estrutura a cidade. É a irrupção do insuportável à leitura e que exige leitura para a qual a tão assustada quanto autoritária sociedade civil é analfabeta. E politicamente analfabeta.

Em vez do gesto auto-contente, o que a pixação revela é a irrupção de uma lírica anormal. A Internet com seus blogs (horrendos, bonitos, mais bem feitos ou mais mau-humorados) é o seu análogo perfeito. A pixação revela o desejo da publicação que manifesta a cidade como uma grande mídia em que a edição se dá como transgressão e reedição onde o pichador é o único a buscar, para além das meras possibilidades de informar ou comunicar, a verdade atual da poesia, aquela que revela a destruição da beleza, o espasmo, a irregularidade, a afronta, que não foi promovida pela pixação, mas que ela dá a ver. Em sua existência convulsa a pixação é a única lírica que nos resta.


Grafite, pixação e arte


Uma das falas da Marcia Tiburi na última aula foi relacionada ao fato do bom artista ser aquele que não desvincula sua produção do contexto histórico em que vive. Outra característica citada por ela é o relacionamento deste artista com a quebra de paradigmas.

Me lembrei dos grafiteiros, hoje valorizados como “boa arte” em relação aos pixadores. Definiu-se que os primeiros “fazem arte” e os outros “sujam a cidade”. No entanto, boa parte dos grafiteiros de hoje foram pixadores de ontem. 

Na Bienal de São Paulo 2008, “pixadores” sacaram de suas latas e escreveram seus nomes e outros símbolos em uma área vazia da exposição. Foram tratados como vândalos e pelo menos um deles foi preso na época. Na Bienal seguinte, ganharam credenciais como “artistas” (leia mais AQUI).

Quem de fato faz arte e quem não faz? Podem os pixadores e sua produção serem excluídos do contexto histórico em que vivem? Eles quebram paradigmas? Questões para nossa reflexão...

Sérgio Pereira

PS: sou músico, como sabem e tenho um projeto ao lado de minha esposa, a cantora Marivone Lobo, chamado Baixo e Voz (www.baixoevoz.com.br). Gravamos uma música chamada “Grafite” no nosso álbum “Viagens de Fé” (2008). Espero que curtam (é so clicar no play abaixo):


GRAFITE
Silvia Mendonça / Marivone Lobo

O artista passa e ninguém vê
Na mochila há cores e idéias
Ele tem a cidade inteira pra pintar
 
Faz olhos nas paredes e muros
Setas, curvas, retas e tortas
Que apontam tudo e todo lugar

Um escolheu o esgoto
O outro, arranha o céu
A moça faz corações
Um cola, outro descola
Precisa de um que apóie
Quem sabe no que vai dar?
 
Pro artista o concreto é tela
Até o asfalto o é
Se aceita tinta é que não quer ser cinza
 
Seus olhos nas paredes e muros
Podem durar ali um só dia
Mas reaparecem em outro lugar
 

Pôs o que ganhou
Na escadaria lá da Vila
Hipnotizou
Sua arte não tem preço, é de graça



sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

dadaísmo

Primeiramente gostaria de parabenizar  a colega Silvia pelo excelente trabalho e falar um pouco da obra de Benjamin, onde ele retrata o Dadaísmo, formado em 1916 em Zurique por jovens franceses e alemães que, se tivessem permanecido em seus respectivos países, teriam sido convocados para o serviço militar, Dada é uma palavra francesa que significa na linguagem infantil "cavalo de pau". 
"Uma de suas principais tarefas era de gerar demanda cujo atendimento só poderia produzir-se mais tarde...( )sem interesse em assegurar a utilização mercantil...( )"
O Dada foi um movimento de negação, pois expressava a decepção em relação a incapacidade da ciência, religião e filosofia), defende o absurdo, a incoerência, a desordem, o caos..alegrando-se com isso. Prova disso foi a pintura de bigodes em Monalisa por Marcel Duchamp (1887-1968), pintor e escultor francês, como mostra a figura, aniquilinado impiedosamente a aura de suas figuras.
Edi Sartori

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Reprodutibilidade da arte

Primeiro post, muita responsabilidade! Porém, vou apenas inserir um pequeno pensamento para dar início ao nosso blog. Afinal, alguém tem que começar!
Ao ler o texto de Walter Benjamin, "A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica", me deparei com uma passagem que me chamou a atenção, e, confesso, 'vesti a carapuça'! Benjamin escreve "Fazer as coisas ficarem mais próximas é uma preocupação tão apaixonada das massas modernas como sua tendência a superar o caráter único de todos os fatos através da sua reprodutibilidade. Cada dia fica mais irresistível a necessidade de possuir o objeto". Tenho que confessar que sofro deste mal (é mesmo um mal?). E faço isso com orgulho. Sim, eu gosto de "possuir o objeto". Tenho como fundo de tela do meu computador A Noite Estrelada do Van Gogh. É uma reprodução de uma obra? É. Mas isto me deixa feliz. Gosto de ligar meu computador, às 8 da manhã, após ter dormido muito pouco, e ver uma tela do Van Gogh antes mesmo de dizer bom dia aos meus colegas de trabalho. É agradável aos olhos, à alma e, porque não, ao meu humor.
Alguém mais se identifica?
Abraços a todos!
Silvia